Comitê que decide sobre a Covid-19 em Aparecida não tem transparência
Da Redação
O Comitê de Enfrentamento e Prevenção ao Novo Coronavírus, criado pela prefeitura de Aparecida em março do ano passado, quando a pandemia ensaiava seus primeiros casos em Goiás, tem maioria de representantes do setor empresarial, em detrimento das classes trabalhadores, de médicos e especialistas ou de qualquer outra categoria.
Isso, na prática, resulta na prevalência dos interesses na manutenção da economia em funcionamento sobre qualquer outro aspecto quanto à prevenção ou contenção da propagação da Covid-19 em Aparecida. Para dividir a responsabilidade por medidas como o fechamento temporário das atividades não essenciais da economia, o prefeito Gustavo Mendanha (DEM) costuma alegar que as decisões não são suas e sim do Comitê.
Estão no Comitê representantes da Associação Comercial e Industrial de Aparecida – ACIAG, da FECOMÉRCIO, da FIEG, da Associação de Feirantes – AFAG, do SESI e do SENAI, da Federação das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte em Goiás – FEMICRO-GO e da Associação Comercial, Industrial e Empresarial da Região Leste de Aparecida – ACIRLAG. No total, sete membros identificados com os interesses do empresariado.
Para falar diretamente pelo restante da população, há apenas o representante do Conselho das Associações de Moradores de Aparecida – CAMAP. E apenas um médico, o secretário municipal de Saúde Alessandro Magalhães. As reuniões do Comitê são resumidas em atas, ocultadas sob sete chaves. Nenhuma foi jamais divulgada, até o momento. O Ministério Público e a Defensoria Pública, que têm cadeiras no Comitê, não se pronunciam a respeito do desequilíbrio na formação do grupo.
Não à toa, o município foi praticamente o único de grande porte, no país, a reabrir o comércio, indústria e serviços, após 14 dias de lockdown parcial, mediante o sistema de escalonamento intermitente por regiões – que deixa todos os bairros da cidade expostos a aglomerações e ao contato entre pessoas que, neste momento, pode agravar a transmissão do coronavírus. Essa situação, agora, terá que ser revista diante do decreto do governador Ronaldo Caiado adotando o lockdown de 14 dias em todo o Estado, a partir desta quarta, 17.
Com Aparecida vivendo uma situação de calamidade pública, tendo a sua rede hospital pública e privada sobrecarregada em níveis extremos, sem nenhuma disponibilidade de leitos de UTIs para pacientes em estado crítico, por exemplo, o escalonamento intermitente foi criticado como absolutamente inconveniente para a maioria da população, embora atenda aos interesses da área empresarial municipal.
Outro problema sério é que o sistema de rodízio, que fecha as atividades econômicas não essenciais por apenas dois dias por semana em cada macrozona, diverge da política adotada pela vizinha Goiânia, que prorrogou o lockdown parcial por mais 14 dias a partir da última segunda-feira, 15 – o que, agora, tende a ser corrigido com a adesão obrigatória de Aparecida ao decreto estadual de fechamento por 14 dias.
O governo do Estado agiu de maneira diferente da prefeitura de Aparecida ao decretar um sistema de revezamento, a partir desta semana, que não tem nada a ver com qualquer tipo de interrupção intermitente por regiões. Pelo decreto de Caiado, o comércio, indústria e serviços cerrarão as portas por 14 dias consecutivos, abrindo em seguida por outros 14 dias, o chamado 14 x 14. Com tempo maior de suspensão dos negócios, criam-se melhores oportunidades para a redução da propagação da Covid-19.
Israel, citado por Mendanha, baixa novo e duro lockdown
Grande exemplo citado pelo prefeito de Aparecida Gustavo Mendanha para defender o escalonamento intermitente do comércio, indústria e serviços no município, por regiões, Israel voltou a adotar novamente um lockdown total em todo o país.
Os israelenses são os que mais avançaram até agora no controle da Covid-19, em todo o mundo, com a vacinação de mais de 60% da população e uma redução drástica no número de casos. Mesmo assim, nesta semana, o fechamento das atividades econômicas e sociais voltou a ser implantado.
Isso esvazia o discurso de Mendanha para justificar a decisão de reabrir Aparecida, mesmo com o município colapsado quanto ao seu sistema de saúde, sem leitos de UTIs e sequer enfermarias para atendimento aos pacientes da nova doença.
A suspensão das atividades em Israel valerá pelas próximas duas semanas e, ao contrário de Aparecida, é tão rigoroso que nenhum cidadão poderá sequer se afastar da sua residência por mais de um quilômetro e meio.
Esse é o terceiro lockdown baixado em Israel desde o início da pandemia. Uma pesquisa no Google não encontra nenhuma referência de adoção de nada parecido com o escalonamento intermitente por regiões que Mendanha decretou para Aparecida, pela segunda vez.
Mesmo assim, o prefeito de Aparecida, sempre que fala em defesa do rodízio, que na prática permite a abertura de comércio, indústria e serviços por toda a cidade, com uma diferença de 2 dias, continua citando Israel como exemplo – que, como se vê, ele não segue.