Prefeitura descumpre decisão judicial e não oferece moradias populares para famílias de ocupação
Ordem da Justiça determina ainda que a gestão do município não pode realizar despejos coletivos, sob pena de multa de R$ 100 mil por ato de descumprimento
Eduardo Marques
A Prefeitura de Aparecida de Goiânia descumpre decisão da Justiça e não oferece casas populares para famílias da Ocupação Beira-Mar, no Setor Independência Mansões. No dia 6 de outubro a Juíza de Direito Vanessa Estrela Gertrudes, da Comarca de Aparecida, determinou que o poder público municipal realoque as 56 famílias removidas do espaço para abrigos com condições dignas de moradia em no prazo máximo de 30 dias. A comunidade foi despejada sem mandado judicial de uma área da Serra das Areias, no dia 27 de setembro deste ano.
A decisão ainda proíbe o município de realizar desocupações sem a observância estrita das diretrizes estabelecidas na Medida Cautelar proferida na ADPF 828/DF, sob pena de multa de R$ 100 mil por ato de descumprimento. Essa ADPF, acatada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu por seis meses (contados a partir de julho deste ano) as desocupações coletivas.
O líder da Ocupação Beira-Mar, Dione Santos critica a resistência da Prefeitura de Aparecida de Goiânia em oferecer moradias dignas para as famílias. “Ela tinha que dar uma decisão para a gente, porém até agora nunca nos procurou. Após essa liminar, a prefeitura nunca nem veio aqui”, diz. Devido ao atraso em atender as demandas da comunidade, ele teme novos despejos. “Temos medo deles voltarem aqui e fazerem como antes. Queremos moradia popular e que não nos despeje mais”, declara ao Diário de Aparecida.
A determinação do Tribunal de Justiça de Goiás atende pedido da Defensoria Pública Especializada Processual Cível de Aparecida de Goiânia, que argumentou que as famílias estão em situação de extrema vulnerabilidade socioeconômica. Após o despejo, a prefeitura não disponibilizou nenhum local para abrigo aos ocupantes ou para a guarda de bens e pertences sociais.
A Justiça já havia negado liminar em primeira instância em favor das famílias para proibir o despejo. A defensoria pública de Aparecida de Goiânia, por meio da defensora Tatiana Bronzato, interpôs agravo de instrumento para reformar a decisão.
A defensora argumentou ainda que a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828, em junho deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que, em casos de ocupações ocorridas após o início da pandemia, o Poder Público pode fazer desocupações, desde que seja garantido local de abrigo alternativo.
“A decisão [ADPF 828] não abriu espaços para uma interpretação restritiva aos direitos das famílias moradoras de áreas irregulares. A remoção somente poderá ocorrer caso seja assegurado o abrigo público ou a moradia adequada”, explica.
No documento, a Juíza de Aparecida destacou que “nessa especializada tramitam dezenas de processos promovidos pelo Ministério Público visando responsabilizar o município pela omissão na fiscalização de loteamentos, o que possibilitou a criação de dezenas deles, clandestinos ou irregulares, com inúmeros problemas de infraestrutura, culminando em graves conflitos sociais e sérias dificuldades para seus moradores. Por isso é compreensível que o município, tantas vezes demandado por sua omissão, agora se sinta na obrigação de impedir que mais um loteamento clandestino se inicie”.
A magistrada reconhece o estado de vulnerabilidade social que as famílias se encontram. “Registre-se que as condições em que essas famílias estão vivendo atualmente na área ocupada é que demonstram a sua situação de risco, pois vivem em condições precárias e insalubres, sem dignidade, haja vista inexistir no local qualquer infraestrutura, e sem possibilidade de vir a ter, pois não se trata de loteamento aprovado, mas, sim, de imóvel particular, sem informações nos autos de que essa gleba poderia efetivamente e futuramente ser loteada.”
A reportagem entrou em contato, por e-mail, com a Secretaria de Comunicação da Prefeitura de Aparecida de Goiânia para saber o motivo do poder público municipal não ter cumprido a decisão da Justiça, além se há algum projeto de moradia popular para as famílias da Ocupação Beira-Mar, mas até o fechamento desta edição, ela não havia se manifestado. O espaço segue aberto para novas manifestações.