Não era nem um nem outro: Mendanha achava ser “mito” e “escolhido por Deus”
Ex-prefeito de Aparecida acolhe derrota fragorosa na disputa pelo governo de Goiás, vencida com facilidade por Caiado logo no 1ֻº turno
A derrota acachapante colhida neste domingo, 2 de outubro, pelo ex-prefeito de Aparecida Gustavo Mendanha tem para ele um gosto amargo: significa, a partir de agora, uma marcha à ré na sua carreira política, depois de uma eleição da qual saiu menor do que entrou.
Pessoalmente, o tombo de Mendanha corresponde a uma queda do 10º andar de um edifício. Politicamente, terá um custo elevado, sacrificando o seu futuro e o jogando no ostracismo até 2026, a menos que, na eleição municipal de 2024, prefira disputar um mandato de vereador em Aparecida ou em Goiânia.
Ninguém acredita que o ex-prefeito terá altura para se manter vivo no cenário político em um prazo tão grande ou se humilhando a uma disputa eleitoral que o apequenará – e mesmo se, no seu lugar, lançar a esposa Mayara Mendanha para a vereança. A queda do status e do prestígio de quem se achava um “mito” e “escolhido por Deus” para governar os goianos terá consequências drásticas.
Ao retornar à Aparecida a partir desta segunda-feira, 3, depois de perder para Ronaldo Caiado ainda no 1º turno sem conseguir alcançar o objetivo de polarizar com o governador, Mendanha encontra a sua base política fraturada por divergências internas que parecem incontornáveis.
Um exemplo notável é a briga de morte instalada entre o prefeito Vilmar Mariano (Patriota) e o presidente da Câmara André Fortaleza (MDB), que, dizem as más línguas, chegou a um ponto de não retorno e tende a ser resolvida com o impeachment de Vilmarzim – motivos, segundo André Fortaleza, não faltariam.
Mas há outros problemas tumultuando o outrora tranquilo quintal controlado com mão de ferro pelo ex-prefeito. Um deles é o poder de atração do vice-governador eleito Daniel Vilela, que prometeu na campanha uma atuação política e administrativa intensa em Aparecida como representante do governo do Estado, inclusive com a abertura de um gabinete oficial na cidade.
Sintomaticamente, na entrevista na noite deste domingo, 2, no seu esvaziado comitê de campanha, em que reconheceu a derrota para Caiado, o ex-prefeito admitiu ter incorrido em “erros de articulação”, cometeu um ato falho ao dizer que “morro, mas morro de pé”, já prenunciando a sua morte política, e lamentou as “traições” exatamente em Aparecida. Não revelou, no entanto, a quem estaria se referindo. O choque de realidade para Mendanha, com o resultado das eleições, correspondeu a uma carga metafórica de 100 mil volts.
Na reta final para as urnas, ele acreditava em mentiras como um “sentimento das ruas” favorável a ele e, como bom bolsonarista, atacou as pesquisas. No caso da corrida pelo Palácio das Esmeraldas, contudo, elas estavam certas e foram confirmadas pela vitória de Caiado no 1º turno – demonstrando de forma clara tanto o potencial do governador como a fragilidade e falta de consistência dos seus adversários.
Bastidores apontam para a tentativa de reaproximação com Daniel Vilela
A entrevista em tom ameno em que procurou ser humilde ao reconhecer a sua derrota, pontuada de comentários elogiosos ao governador Ronaldo Caiado, na noite deste domingo, 2, sinaliza o próximo movimento político do ex-prefeito de Aparecida Gustavo Mendanha: uma reaproximação com o seu antigo “irmão” Daniel Vilela, eleito vice-governador na chapa de Caiado, com objetivos ambiciosos como o de ocupar um cargo na nova gestão estadual a partir de 1º de janeiro.
Aliados próximos informam, nos bastidores, que Mendanha enviou recados a Daniel Vilela, na reta final da campanha, quando teria apresentado a proposta de um encontro para uma conversa presencial. O vice eleito de Caiado não respondeu.
Ao falar à imprensa, após anunciada a sua derrota já no 1º turno, o ex-prefeito surpreendeu pelo tom pacífico adotado ao citar Caiado, em quem reconheceu uma experiência político muito superior à sua. Não fez ironias e pareceu conformado com o resultado, dentro da estratégia de se mostrar amigável e aberto ao diálogo. Não mencionou, no entanto, Daniel Vilela, nem sequer para os cumprimentos de praxe, deixando claro que existem ainda resquícios da disputa por projeção que sempre teve com o filho de Maguito Vilela e que se externou no rompimento entre os dois e a saída de Mendanha do MDB.
O prefeito Vilmar Mariano, por ora vinculado a Mendanha, tem interesse em se aproximar do governo do Estado para viabilizar recursos para obras em Aparecida que possam resultar em dividendos eleitorais para a sua reeleição, em 2024. Ele, hoje, administra um caixa estourado, consumido pela pesada folha de pessoal que herdou como consequência da distribuição a mancheias de cargos para a classe política, mecanismo que levou a uma unidade artificial em torno do ex-prefeito e ajudou nas suas duas eleições.
“Ele é o novo rei Davi, ungido para governar o povo de Goiás”, garantia a esposa Mayara
“E eu me lembrei de uma história da Bíblia, porque eu não posso negar minha fé num momento tão histórico como esse, entre Davi e Saul. Havia crescido no coração de Saul, ele sendo rei de Israel, ele já não estava governando o povo com Justiça, e por isso, Deus desagradou com as atitudes de Saul e levantou um novo rei que se chamava Davi. Era um homem jovem que não tinham expectativa na vida dele, que jamais alguém pensaria que ele governaria Israel de uma forma tão justa. Mas Deus ungiu Davi que se levantou. Para chegar a ser rei, Deus levantou um exército. E hoje eu vejo aqui o exército do Gustavo que fará dele, governador do Estado de Goiás. Hoje eu vejo o marco de uma nova história”.
Isso era o que, há um ano, dizia a ex-primeira-dama de Aparecida Mayara Mendanha, evangélica fervorosa conhecida pelos surtos místicos que a acometem publicamente em cultos religiosos, conhecidos como “picos de euforia”, nos eventos da pré-campanha que então se iniciava.
Revelam amigos do casal que foi Mayara quem convenceu Gustavo Mendanha a jogar na lata de lixo 2 anos e 9 meses de mandato como prefeito de Aparecida em troca da aventura inconsequente da disputa pelo governo do Estado, para a qual o marido – está provado agora – não tinha estatura.
A conversa sobre o rei Davi foi espalhada por Mayara não só em Aparecida, mas em todo o Estado, acompanhando Mendanha nas suas viagens desesperadas atrás de apoio político – que nunca vinha. Aparentemente, ela acreditava piamente nessa estória, mas se esqueceu de que Deus não costuma se interessar por política e tem muito o que fazer cuidando de quem precisa – o que Mendanha e a esposa não fizeram na prefeitura de Aparecida, onde passaram 5 anos e 3 meses sem criar um único programa social para apoiar os desfavorecidos e necessitados.