Mulheres enfrentam o desafio de conquistar o sustento como autônomas no setor da beleza
Mercado é promissor, mas profissionais revelam que não são preparadas para atuar sozinhas
Jussara Costa, 32 anos, trabalhou em um salão em um shopping de área nobre por mais de 10 anos. Com a pandemia de Covid-19, em 2020, a unidade de beleza teve que ficar fechada por mais de 90 dias, devido às medidas sanitárias vigentes. Com a retomada, o número de clientes diminui e o rendimento dela, que atuava em parceria com a empresa de beleza, cai pela metade.
Ela se viu obrigada a buscar novas alternativas para continuar garantindo a renda que estava acostumada. “Lá no salão eu tinha uma comissão em cima do total produzido, mas eu não tinha fixo, como resultado eu estava tendo gastos para ir trabalhar e para me manter fora de casa que não estavam sendo cobertos pelo meu trabalho. Decidi que iria tentar atender em casa”, explicou a manicure especializada em alongamento em gel.
Ela revela que, para ser autônoma, precisou aprender coisas novas. Entre elas aprender a conciliar a rotina de casa com o trabalho e a mexer em redes sociais.”A primeira coisa que precisei aprender foi a me organizar. Se atendo na sala de casa, ela precisa estar arrumada quando minha primeira cliente chegar. Então eu preciso acordar mais cedo, fazer as coisas pessoas e pôr a casa em ordem”, conta.
A manicure conta ainda que precisou aprender a organizar fluxo de caixa, calcular preço e também a gerar conteúdo para seu instagram, que é o principal canal de relacionamento com seus clientes. Jussara explica que nas primeiras semanas foi assustador. “Eu achava que não ia conseguir. Muita coisa nova e diferente do que eu era habituada”, finaliza.
Quem também deixou um salão conceituado após 8 anos foi Simone Brito, 35. “Eu estava cansada, queria mais sossego. Estava um bebê de 8 meses e queria ficar mais tempo com ele. Conversei com meu marido e organizamos uma sala para que pudesse atender dentro de casa e deu certo”, conta.
Simone relata que os primeiros meses são assustadores para quem é acostumado a trabalhar para outras pessoas. “Eu acredito que mais de 90% das manicures são parcerias dos salões e não recebem nada fixo, mas quando passamos a ser responsáveis, de verdade, pela nossa renda é assustador”, falou.
Segundo ela, a primeira e principal dificuldade que encontrou foi atrair os clientes.”Eu atendia no Jardim Goiás, passei a atender aqui no Garavelo. O público era outro e a realidade financeira também. Demorei um tempo para entender que eu precisava adequar os valores para conquistar a clientela. De que adiantava ser boa se as pessoas não tinham condições de pagar o que eu cobrava?”, explicou.
A manicure, que tem como carro chefe o spa dos pés – que é um procedimento de relaxamento e de restauração do pé ressecado – fala claramente que aprender a divulgar seus produtos pela internet foi uma das sua maiores dificuldades. “Eu não era preparada. O salão fazia isso por mim. Nunca havia me interessado em aprender. Mas precisei e corri atrás”, desabafa.
Tanto Jussara quanto Simone destacam que manter o trabalho em casa e trabalhar por conta própria é muito desafiador. “Tudo depende da gente. O trabalho é maior. É dobrado. A gente precisa se reinventar todos os dias”, enfatiza Jussara que é formalizada como microempreendedora individual e arrecada impostos para ter direito a benefícios governamentais como licença maternidade e aposentadoria.
Simone, por sua vez, é autônoma. Ou seja, ela não é regulamentada e não tem direito a nenhum dos benefícios que Jussara tem. “Já até pensei em começar a pagar o MEI, mas honestamente eu não vi nada que fosse tão vantajoso”, finaliza.
As duas fazem parte de um mercado que cresce avassaladoramente no Brasil: o mercado da beleza. De acordo com dados do Sebrae, o faturamento do segmento da beleza representa 4% do PIB nacional.
Números da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec) revela que o Brasil ocupa a 2ª posição entre os países que mais lançam produtos na área e está em 4º lugar entre os países que mais consomem produtos de beleza no mundo. Tantos números positivos, dão ao brasileiro o título internacional de um dos povos mais vaidosos do planeta.
E, é por isso, segundo Tarcila Picinini, economista especializada no mercado da beleza, que nem mesmo durante a pandemia, as brasileiras deixam a vaidade de lado. “Com os rendimentos em baixa, as mulheres do Brasil adotaram e foram uma das impulsionadoras daquilo que é conhecido internacionalmente como “Do it yourself”, conhecido em português como “faça você mesmo””, pontua.
Ela explica que o “faça você mesmo” é quando o cliente opta por fazer os procedimentos estéticos como cortar e/ou pintar os cabelos, fazer a unha ou mesmo se depilar em casa sem contratar o serviço de terceiros. Segundo ela, isso foi muito popular na pandemia e é uma tendência bem avaliada pelo Google.
De acordo com pesquisa desenvolvida pelo grupo Google, 34% das pessoas pretendem que aprenderam a fazer algum procedimento estético em casa durante a pandemia, pretendem voltar a terceirizar os serviços que achar necessário; 14% pretende terceirizar apenas cuidado com os cabelos; 13% pretende continuar sem terceirizar os serviços, 11% querem terceirizar maquiagem, 10% unhas e 9% cuidados estéticos com a pele.
Este o caso da jovem Suzana Rocha, 19 anos. Na pandemia, ela se dedicou a aprender maquiagem pelo youtube e com lives realizadas por profissionais renomadas do mercado. Hoje ela cobra de R$ 200,00 a R$ 350,00 por cliente. “Faço uma média de 8 clientes por final de semana. É uma renda que eu não conseguiria de outra forma”, justifica.