CBF demite Dorival Júnior e abre novo ciclo na Seleção Brasileira: especialistas analisam causas e impactos da decisão
Desempenho irregular, falta de identidade tática e instabilidade nos bastidores pesaram para a saída do técnico; próximos meses serão decisivos para a reconstrução da equipe rumo à Copa de 2026
A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) decidiu nesta sexta-feira, 28, demitir o técnico Dorival Júnior do comando da Seleção Brasileira. A decisão foi antecipada por fontes internas da entidade e será oficializada após uma reunião entre o treinador e o presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, ainda hoje. O desligamento ocorre em meio à pressão crescente por resultados e por um projeto técnico mais sólido às vésperas da reta final das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2026.
Dorival estava à frente da equipe desde janeiro de 2023 e, em pouco mais de um ano, acumulou altos e baixos. Apesar de ter estreado com vitórias convincentes e contar com respaldo da torcida inicialmente, a falta de consistência tática e de resultados expressivos nas Eliminatórias acabou corroendo sua permanência. Em 14 jogos oficiais sob seu comando, o Brasil venceu 6, empatou 4 e perdeu 4 – um aproveitamento de 52%, o mais baixo desde a Era Dunga (2006–2010).
Crise de identidade e queda de desempenho
Para o jornalista e comentarista esportivo Carlos Cerqueira, a demissão de Dorival reflete mais do que uma simples troca de técnico. “A Seleção vive uma crise de identidade. O Brasil perdeu o protagonismo ofensivo que o caracterizava. Com Dorival, houve uma tentativa de resgatar esse DNA, mas faltou tempo, convicção e respaldo interno. A instabilidade política dentro da CBF também contaminou o ambiente da comissão técnica”, avaliou.
O ponto de inflexão teria sido a sequência de jogos sem vitória no fim de 2024: empate sem gols com o Paraguai, derrota para o Uruguai por 2 a 0 e um desempenho considerado burocrático contra a Venezuela. A oscilação em campo foi agravada por críticas quanto à convocação de jogadores sem ritmo e a demora em promover renovação efetiva no elenco.
Pressão por resultados e falhas de planejamento
Para a professora de gestão esportiva da USP, Luciana Bittencourt, a decisão da CBF é sintomática de um modelo que prioriza o imediatismo em detrimento do planejamento técnico de longo prazo. “O Brasil ainda trata o comando da Seleção como um cargo de urgência, sem estabelecer critérios claros de continuidade. Dorival não foi o problema central, mas sim a falta de um projeto que sustente um técnico diante da primeira crise. Estamos falando de um treinador com perfil conciliador, mas que não teve respaldo suficiente nem autonomia para conduzir a transição da equipe”, pontuou.
Luciana lembra que países como França e Inglaterra passaram por períodos longos de instabilidade até consolidarem seleções competitivas. “No Brasil, o calendário, a pressão da mídia e os interesses políticos internos acabam atropelando qualquer tentativa de gestão técnica moderna.”
CBF sem plano B definido
O substituto de Dorival ainda não foi anunciado. Nos bastidores, circulam nomes como Fernando Diniz, atualmente à frente do Fluminense, e o espanhol Luis Enrique, que teria demonstrado interesse em assumir uma seleção sul-americana. Outra possibilidade ventilada é o retorno de Tite, técnico que comandou a Seleção nas Copas de 2018 e 2022.
No entanto, segundo o analista tático Felipe Sampaio, qualquer nome que assuma a equipe encontrará um cenário desafiador. “Falta à Seleção uma espinha dorsal. Dorival tentou criar isso, apostando em jogadores como Bruno Guimarães, Rodrygo, Endrick e Gabriel Magalhães, mas houve muita rotatividade e lesões frequentes. Sem um time base, sem entrosamento e com uma Copa se aproximando, o novo técnico terá pouco tempo para implementar uma filosofia”, explicou.
Sampaio destaca que a ausência de um projeto estruturado da CBF para as categorias de base também compromete o futuro do futebol nacional. “Temos talentos individuais, mas eles chegam à Seleção com pouca formação tática e sob forte expectativa. O trabalho do treinador, qualquer que seja ele, precisa ser integrado com um plano federativo maior – coisa que não temos há anos.”
O que esperar do próximo ciclo
Com a saída de Dorival, a CBF se vê diante de mais uma reconstrução às pressas. A Seleção Brasileira ocupa atualmente a 4ª posição nas Eliminatórias, com risco real de perder posições caso a instabilidade se mantenha. Os próximos jogos estão marcados para junho, contra Colômbia e Chile, e devem ser comandados por um técnico interino, caso a definição do novo nome não ocorra nas próximas semanas.
O momento exige mais do que uma troca de comando: é preciso clareza no projeto técnico, compromisso com a renovação do elenco e autonomia para a comissão técnica trabalhar sem interferências externas. Sem isso, o Brasil corre o risco de chegar à Copa de 2026 com um time ainda em formação – e mais distante do protagonismo que um dia o fez temido no cenário internacional.