ICMS sobre importações online sobe em dez estados; Goiás opta por manter alíquota de 17%
Ajuste fiscal visa equilibrar mercado nacional, mas pode elevar preços e afetar consumo popular em todo o país
Desde 1º de abril, entrou em vigor em dez estados brasileiros o aumento da alíquota do ICMS sobre compras internacionais feitas pela internet, passando de 17% para 20%. A medida atinge produtos de até US$ 50 adquiridos em sites estrangeiros — categoria que cresceu exponencialmente com a popularização de plataformas como Shein, Shopee e AliExpress.
O ajuste foi aprovado em dezembro pelo Comitê Nacional de Secretários de Fazenda (Comsefaz), sob o argumento de equiparar a tributação dos produtos importados aos fabricados no Brasil. O objetivo declarado é “garantir isonomia competitiva” e “proteger o setor produtivo nacional”.
Goiás, no entanto, optou por não aplicar o reajuste neste primeiro momento, mantendo a alíquota anterior. A decisão posiciona o estado entre os que adotaram cautela fiscal diante do impacto da medida sobre o consumo.
Especialistas alertam para impacto nacional, mesmo em estados não aderentes
Apesar de não elevar a alíquota, Goiás pode sofrer efeitos indiretos. A avaliação é do advogado tributarista Francisco Gomes Júnior, presidente da Associação de Defesa de Dados Pessoais e do Consumidor (ADDP). Segundo ele, os preços praticados no comércio digital são impactados por cadeias logísticas interestaduais, o que pode atingir consumidores goianos.
“O ICMS é estadual, mas o comércio eletrônico não respeita fronteiras. Produtos importados podem entrar por estados que aplicaram a nova alíquota e serem redistribuídos. O resultado é um repasse generalizado de custos ao consumidor final — mesmo em Goiás”, afirma.
Economista da FGV vê risco de inflação e retração no consumo popular
O economista Fernando Ribeiro, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, reforça que o aumento do ICMS sobre itens de baixo valor afeta diretamente a base de consumo das classes C, D e E.
“Esses produtos são consumidos massivamente por camadas de menor renda, seja por uso próprio ou por microempreendedores. O aumento de 3 pontos percentuais parece pequeno, mas representa um acréscimo importante no valor final. Isso pode reduzir a demanda, afetar o volume de vendas e gerar reflexos inflacionários”, analisa.
Para ele, mesmo estados como Goiás, que não aderiram à nova alíquota, tendem a sentir os efeitos macroeconômicos. “Não há como blindar totalmente uma economia regional das decisões fiscais de outras unidades federativas, especialmente em um setor integrado como o comércio digital.”
Tributarista aponta impacto sobre o empreendedorismo informal
A professora Larissa Monteiro, especialista em Direito Tributário da Universidade Federal de Goiás (UFG), destaca que o impacto da medida pode ser ainda mais significativo sobre o microempreendedor informal, que utiliza compras internacionais como base de negócio.
“Muitas mulheres e jovens empreendem revendendo produtos importados de pequeno valor. O aumento do ICMS em parte do território nacional cria um desequilíbrio competitivo e pressiona a cadeia informal, que já opera com margens apertadas”, aponta.
Ela também critica o momento da medida, em meio à transição para o novo sistema tributário baseado no IVA. “É incoerente ampliar a carga de um imposto que está prestes a ser extinto. Isso gera insegurança jurídica e desorganiza a estrutura tributária em fase de reformulação.”
Medida amplia desigualdades regionais e pode gerar judicialização
Além dos impactos econômicos, especialistas destacam o risco de aumento da desigualdade entre estados. A disparidade de alíquotas pode favorecer determinadas regiões em detrimento de outras, distorcendo o ambiente de concorrência. Larissa Monteiro também vê risco de judicialização:
“Se um mesmo produto tem tributações diferentes dependendo do estado de entrada, isso afeta o princípio da isonomia e pode ser questionado judicialmente por empresas ou associações de consumidores.”
Estados que adotaram a nova alíquota de 20%
A medida está em vigor nos seguintes estados:
-
Acre
-
Alagoas
-
Bahia
-
Ceará
-
Minas Gerais
-
Paraíba
-
Piauí
-
Rio Grande do Norte
-
Roraima
-
Sergipe
Goiás, São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, Distrito Federal e outros 13 estados não adotaram a alíquota mais alta — ao menos por ora.
Mesmo fora da nova alíquota, Goiás permanece exposto aos efeitos do aumento do ICMS
A decisão de Goiás de não aderir ao aumento do ICMS sobre importações online representa uma posição estratégica em defesa do consumo interno e da economia popular. No entanto, especialistas alertam que os efeitos da medida adotada em outros estados devem ser sentidos nacionalmente, com repasses indiretos, aumento de preços, retração no consumo e possível crescimento da informalidade.
A nova alíquota marca mais um capítulo da complexidade tributária brasileira e expõe os limites do federalismo fiscal em tempos de integração digital e consumo transfronteiriço.