Intolerância: Marconi processa críticos. Já Caiado e Iris, não. E Maguito, nunca
O Ranking da Vergonha é o dos políticos que mais acionam autoridades (delegados, tabeliães, juízes) para tentar punir quem expõe crítica sobre suas gestões, projetos e outros produtos do trabalho que são pagos para fazer. Difícil saber quem o lidera, mas é provável que o ex-governador Marconi Perillo seja um deles. Deve haver por aí outra lista, a dos mais fustigados por políticos em cartórios, delegacias e Poder Judiciário. Difícil saber quem a lidera, mas é provável que o autor destas linhas esteja entre os primeiros.
Marconi passou 32 anos no centro do poder: quatro dentro do Palácio das Esmeraldas como assessor do governador Henrique Santillo, mais dois mandatos de deputado estadual e federal, quatro de governador e meio de senador.
Houve tempo e recursos para formar um exército de defensores. Alguns empresários quebraram, mas diversos ficaram muito ricos em seu reinado. Nomeou procuradores-gerais de Justiça, desembargadores, integrantes dos Tribunais de Contas. Fincou em peitos orgulhosos tonelada e meia de medalhas. Enfim, está bem amparado.
Quando Marconi aciona o Judiciário, a polícia e os cartórios, sabe o mato em que está lenhando – com o gás a mais de R$ 100 o botijão, mantém acesa a panelinha. Nesta véspera de fim de semana, disse numa rede social que pediu a um órgão público para exigir explicações do governo de Goiás sobre empregados de veículos de comunicação que o criticam.
É fácil entender: ele acha que ainda está acima do bem e do mal, não caiu a ficha de que virou molambo na História: o império que Marconi passou 32 anos construindo ruiu em menos de 32 meses. Teria dificuldades para ir à Feira da Marreta no domingo sem ouvir poucas e más.
Pode andar por Pirenópolis e Cidade de Goiás, mas com fantasia de mascarado na velha Meia-Ponte e de farricoco em Vila Boa. Um dos motivos do ódio das pessoas talvez seja o de não ter enfrentado quem quer que seja com a chamada paridade de armas, de igual pra igual. Quando partiu para cima dos coitados foi com bate-paus armados, pistoleiros na imprensa comprada, magistrados prontos para o que desse e viesse. Marconi fez do salário dos jornalistas praticamente uma fonte de renda. Este que vos escreve teve as contas zeradas pela Justiça para colaborar com os cofres do ex-governador.
Claro, atualmente está fácil expor as mazelas da Era Marconi. Meio-mundo hoje é caiadista, apesar de o próprio Ronaldo não crer numa palavra sequer do que eles supõem que ele ouça. Entre donos de jornais, sites e outras formas de prostituição, quase todos se dizem amigos de Ronaldo Caiado desde antes do primo Jorge Caiado e do irmão Roberto Caiado. Tem dono de empresa de publicidade que faz mais juras a Ronaldo do que Gracinha Caiado.
Proprietários de produtoras de vídeos amam os Caiado desde Totó, Brasil etc. E quem a conhece sabe que a família Caiado é avessa a esses vagabundos. Ronaldo e Gracinha não têm nem paciência para esses imundos. Jorge, se tiver chance, mete a porrada na cara dos meliantes adesistas – bem feito, Jorjão.
A referência não é a esses capachos de todos os governos e governantes. Trata-se aqui de quem criticou o Marconi entronado, quando escolhia os adjetivos com que os áulicos o elogiariam, aquele que mandava nos quatro poderes (principalmente no aquisitivo, segundo a piada da turma do Casseta & Planeta).
Aprenda com quem é contra, não prenda
Já respondi a centenas de ações movidas por Marconi e seus aliados. O nome técnico é outro quando estão em cartórios e delegacias, mas a canseira é a mesma. Dessas iniciativas de Marconi, tirei diversas lições, algumas caríssimas – sou tão pobre hoje quanto Marconi era em 1998, véspera de tomar posse no governo. Meu algoz não captou a mensagem principal: aprenda com as críticas, não prenda os críticos.
Marconi executou à ufa a máxima segundo a qual não se deve dar notícia a quem quer dinheiro ou dinheiro a quem quer notícia. E os dois produtos rolaram mais que Sonrisal nas GOs. Nunca recebi um centavo sequer do ex-governador, até porque participei de suas campanhas sem cobrar. Mas ele está com dinheiro meu – e a menção não é ao percentual da arrecadação tirado de cada um dos contribuintes. Dinheiro mesmo, pego em contas bancárias, hoje zeradas. Outros críticos também foram espoliados.
O político cujas atitudes mais critiquei foi Iris Rezende. Muuuuito mesmo. Alguns de seus jagunços se voltaram contra mim, os mesmos que depois aderiram a Marconi. O próprio Iris, no entanto, nunca me processou. Fui desproporcionalmente duro com Maguito Vilela, devido ao simples fato de ele ser do PMDB irista e eu fazer oposição cravada ao partido e seus próceres.
Na maioria das vezes, eu estava errado e fui injusto. Graças a Deus, tive a oportunidade de pedir perdão a Maguito num de seus últimos meses antes da Covid-19. Ele sorriu, disse que não havia o que perdoar, pois simplesmente nem se lembrava de algo que eu tivesse dito ou escrito – ou seja, sua análise sobre o que produzi foi mais aterradora que toda minha catilinária a seu respeito (até com falta de).
Fiz dezenas de críticas a Ronaldo Caiado. Nunca me processou. Nunca processou ninguém, nem os que publicaram baixarias para tentar atingir a sua família. Caiado só levou à Justiça um empresário que publicou hagiografia acusando-o injustamente de racismo – no caso, não foi uma reportagem ou uma análise, foi uma porrada gratuita, que realmente tinha de ser rebatida.
Depois de Marconi sair do cargo, sofrer derrota vexatória nas urnas, ser preso, perder os amigos, está sendo vencido também na Justiça. Nesta semana, caminhou celeremente para pegar oito anos de cana. Tem outras condenações à vista. E olhe que ainda não estão em pauta matérias muito relevantes e outras tantas já prescreveram ou nem foram levadas à Justiça. Suas vítimas estão no poder. Ele, por aí, sonhando com os tempos de fausto – não o do Goethe, por ele desconhecido.
Resta ao ex-governador torcer para que suas ações caiam em gabinetes amigos, para articulações auriculares. Eis uma joia da democracia: há cada dia menos orelhas suscetíveis ao cuspe de Marconi. Mesmo seus indicados negam-lhe ouvidos para saliva – preferem cera à voz do padrinho outrora chefe.
Quem faz o mal costuma receber pior. Não precisa ser crente para se convencer dessa verdade. Os dias finais de Marconi serão de muita tristeza e dor. Por suas postagens nas redes sociais, em 2022 vai se unir a gente da sua igualha e partir para cima dos críticos. Vai levar nova surra nas urnas. Quem encostar apodrecerá junto. (N.G.)